terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O estranho caso das alianças

O título é sugestivo. É quase nome de filme mas é real. Reza assim.
Por EMANUEL SILVA


Um casal de nubentes adquiriu numa ourivesaria do Funchal duas alianças de casamento, em ouro branco de 14 quilates, acetinado, ‘debruadas’ a ouro amarelo, e com 3 brilhantes, mas apenas na da noiva. Pagaram pelas alianças 1.275 euros.
Casaram e logo no dia seguinte verificaram que as alianças estavam riscadas, tendo pessoalmente denunciado os defeitos, tendo acordado que quando regressassem de lua-de-mel deixariam as alianças para reparação.
Assim, no dia 16/06/2011, apresentaram as alianças para reparação e solicitaram o certificado de garantia destas e dos brilhantes. As alianças foram mandadas para reparação, para a marca, no continente.
Passado 7 dias foram contactados para irem buscar as alianças, que em vez de reparadas apenas foram polidas, pelo que passado algumas horas na posse destas verificaram o reaparecimento dos riscos, tendo novamente deixado naquela loja as alianças para reparação e de seguida apresentaram reclamação. Aí foi-lhes sugerido a substituição por outras.
Porém o preço seria superior ao que pagaram, pelo que requereram a resolução do contrato.
Inconformados, os nubentes, agora marido e mulher, recorreram ao Julgado de Paz do Funchal instaurando uma acção declarativa de condenação contra a ourivesaria, pedindo a resolução do contrato pela falta de conformidade do bem e o pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais na quantia de 1.000€.
A juíza de paz apreciou o caso e, a 15 de Julho último, julgou a acção improcedente por não provada. Antes, as partes submeteram-se a mediação, embora sem obtenção de consenso.
Para não dar razão ao casal, o Julgado de Paz do Funchal considerou haver dúvidas se os riscos foram do uso já pelo casal ou de origem. E as alianças até foram analisadas em ‘tribunal’.
“O Tribunal alicerçou a convicção no requerimento inicial, na documentação junta aos autos e na verificação das alianças que lhe foram apresentadas em sede de audiência de julgamento”, refere a sentença.
“No caso destas alianças constata-se que são mais frágeis do que as usadas e vendidas habitualmente em Portugal, cuja percentagem de ouro é de 19,2 quilates, no entanto os demandantes adquiriram este bem sabendo precisamente os quilates que possuíam, o que também faz delas uma jóia mais barata precisamente por ter uma percentagem de ouro menor. Sendo as alianças um objecto de uso diário é necessário algum cuidado, sobretudo quando em contacto com alguns materiais abrasivos, como alguns produtos de limpeza. Demonstra a experiência comum que com o passar do tempo, devido ao uso diário, inclusive a própria transpiração de cada pessoa tem influencia no aspecto destas, uma vez que não é apenas composta de água mas também de minerais, o que pode provocar a oxidação dos metais que compõem a liga”, acrescenta.
“No caso concreto, os demandantes têm diariamente usado as alianças, o que faz com que tenham um aspecto usado, mais baço e oxidadas, dificultando verificar, actualmente, a existência dos riscos que teriam provocado o descontentamento com os bens. Por outro lado, se as usaram diariamente significa que o defeito também não as tornava inadequadas ao fim, quanto muito podia diminuir o valor económico inicial da coisa. Todavia, não é possível actualmente devolver uma coisa, pois é isso que na prática implica a resolução do contrato, que seja constantemente utilizada pois deixamos de ter um bem novo, como aquele que adquiriram, para passar a ter um bem usado, o que implica que o bem foi desvalorizado pelo uso que lhe é dado (…) Nestas circunstâncias é a própria lei do consumo, pese embora tutele na maioria das vezes o consumidor, pois considera-o como a parte mais frágil do negócio, que não aceita que exerça o direito da forma como pretende, motivo pelo qual se declina o pedido de resolução do contrato”, remata.

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