O livro conta com prefácio da escritora Helena Marques,que apresentará a obra em Lisboa. No Funchal, a apresentação da mesma está a cargo de Ana Margarida Falcão. São as memórias de um Funchal reinventado.
Por LUÍS ROCHA
Uma obra que
mistura a realidade com a ficção, procurando não só evocar mas também, de
alguma forma, reinventar o nosso imaginário histórico, é uma das formas
possíveis de caracterizar o livro ‘Retratos e Lugares Secretos’, de Francisco
Clode de Sousa. A obra, uma edição de autor que tem o apoio do Município do
Funchal e que conta com ilustrações de época, da Photographia Museu Vicentes, será lançada no próximo dia 13 do corrente mês de Dezembro (sexta-feira)
em Lisboa. E contará, na oportunidade, com uma apresentadora de peso: a
escritora e antiga jornalista Helena Marques, autora de ‘O Último Cais’ e ‘A
Deusa Sentada’, entre outros livros. O lançamento decorrerá no nº 85 da Rua D.
Pedro V, na capital portuguesa, às 18h30 da supracitada data.
Francisco
Clode de Sousa procederá, depois, a uma apresentação no Funchal, a 16 de
Dezembro (segunda-feira), também às 18h30, no Museu de Arte Sacra. Desta feita,
a apresentação estará a cargo da também autora e professora universitária Ana
Margarida Falcão.
O ‘Domínio
Público’ teve acesso ao livro antes do lançamento, e é evidente o que nele terá
cativado o interesse de alguém que, como Helena Marques, guarda da Madeira
referências especiais do passado e as verteu nos seus romances: trata-se de uma
narrativa desenvolvida em diversos episódios, que insufla vida em diversos
momentos da História da Madeira, caracterizando personagens curiosas, por vezes
burlescas, só possíveis num meio marcado, simultaneamente, pelo
cosmopolitismo que nos traziam os navios que aportavam ao Funchal e pelo
conservadorismo de uma localidade de província. Um paradoxo gerador de
peculiaridades que Francisco Clode ficcionou, sob um pano de fundo de
realidade, entretecida pelo conhecimento histórico e por décadas de ouvir
contar histórias a parentes e conhecidos sobre acontecimentos ou personalidades
incomuns.
"Numa escrita
lúcida e objectiva, velada pela ironia de quem muito ama e impulsionada pelo
imperativo de preservar memórias e costumes que são património colectivo, o
escritor madeirense Francisco Clode de Sousa entrega aos leitores, neste seu
primeiro livro, uma surpreendente evocação do Funchal dos princípios do século
XX (…"), escreve Helena Marques no prefácio. E prossegue elogiando a ‘linguagem
rigorosa, sempre timbrada por um misto de amor e lucidez, mas também por uma
ironia subtil e certeira” que o autor utiliza.
Clode, esse,
explica-nos como surgiu este livro e quais os seus objectivos: “Em todas as
histórias há um travo de realidade e 99 por cento de efabulação. As histórias
podem ter como fundo uma personalidade que existiu, mas a história que eu conto
sobre essa personalidade não tem nada a ver com essa pessoa. No fundo, é uma
perfeita efabulação e a mistura da ficção com a realidade, e com histórias que
eu ouvi. Mas a maior parte é inventado. O que me interessava era captar o
espírito de um lugar e de um tempo e não a verdade da História”. E é nisso que
reside a graça desta aventura literária, sustenta.
“No fundo,
aquilo que me entusiasmou foi a ideia de que uma cidade vai muito para além das
suas memórias físicas, e de que um lugar é, sobretudo, as suas pessoas e aquilo
que elas representam. Tratou-se, no fundo, de dar voz a uma coisa muito etérea:
os quotidianos de outros tempos, gestos, situações, mundos que desapareceram e
que eu quis, de certa maneira nostálgica, fazer voltar”, acrescenta.
O conhecido
museólogo, director de serviços de Museus e Património da Direcção Regional dos
Assuntos Culturais e artista plástico quis ressuscitar um pouco os habitantes
da ilha e a maneira como viviam e se viam a si próprios e aos outros. “No fundo
é uma reconstituição de um tempo histórico”, admite, mas quase como um castelo
de areia, dado que nada daquilo é História… são histórias. “Procurei, no
entanto, que houvesse uma racionalidade de situações, mas não com o intuito de
falar de alguém, ou de nada… Nenhuma das personalidades que aparecem naquele
livro existiu: existiram, isso sim, aquelas circunstâncias”.
Entre as
personagens carismáticas locais e os visitantes estrangeiros, as leituras não
se dividem: completam-se.
“O livro é
sobre o mundo que acaba no cais, um mundo de paróquia, e, ao mesmo tempo, que
começa no Golden Gate”, a tão propalada e cosmopolita ‘esquina do mundo’ de
Ferreira de Castro, por onde se cruzavam visitantes ingleses, expatriados de
Gibraltar, emigrantes de diversas proveniências e habitantes locais de várias
estirpes. Entre um mundo e o outro, tão distantes e tão próximos, efabula-se
neste livro o convívio dos dois.
Francisco
Clode de Sousa não quer ficar por aqui: confidenciou-nos estar a trabalhar num
romance, cujo fulcro pode ser encontrado numa das histórias que compõem este ‘Retratos
e Lugares Secretos’ e sobre cuja matéria não se quer alongar. O romance não tem
data marcada para publicação, nem nada que se pareça… mas nunca se sabe. Nem se
sabe a que tipo de narrativa poderá conduzir. Recheada de tipos fascinantes,
adivinha-se. Porque, como o coloca Clode, “só numa terra como esta, entre os
turistas e os levadeiros, se poderiam ter gerado figuras tão curiosas e com
tanta graça”.
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